quinta-feira, 16 de julho de 2009

SENTAR-SE À JANELA

Por Alexandre Garcia



Era criança quando, pela primeira vez, entrei em um avião.
A ansiedade de voar era enorme.


Eu queria me sentar ao lado da janela de qualquer jeito, acompanhar
o vôo desde o primeiro momento e sentir o avião correndo na pista cada
vez mais rápido até a decolagem.



Ao olhar pela janela via, sem palavras, o avião rompendo as nuvens,
chegando ao céu azul. Tudo era novidade e fantasia..



Cresci, me formei, e comecei a trabalhar. No meu trabalho, desde
o início, voar era uma necessidade constante.


As reuniões em outras cidades e a correria me obrigavam, às vezes,
a estar em dois lugares num mesmo dia.



No início pedia sempre poltronas ao lado da janela, e, ainda com
olhos de menino, fitava as nuvens, curtia a viagem, e nem
me incomodava de esperar um pouco mais para sair
do avião, pegar a bagagem, coisa e tal.




O tempo foi passando, a correria aumentando, e já não fazia questão
de me sentar à janela, nem mesmo de ver as nuvens, o sol,
as cidades abaixo, o mar ou qualquer paisagem que fosse.




Perdi o encanto. Pensava somente em chegar e sair, me acomodar
rápido e sair rápido. As poltronas do corredor
agora eram exigência .


Mais fáceis para sair sem ter que esperar ninguém, sempre e
sempre preocupado com a hora, com o compromisso,
com tudo, menos com a viagem, com
a paisagem, comigo mesmo.



Por um desses maravilhosos 'acasos' do destino, estava eu louco
para voltar de São Paulo numa tarde chuvosa,
precisando chegar em Curitiba o mais rápido possível.



O vôo estava lotado e o único lugar disponível era uma janela,
na úl tima poltrona. Sem pensar concordei de imediato,
peguei meu bilhete e fui para o embarque. Embarquei no
avião, me acomodei na poltrona indicada: a janela.



Janela que há muito eu não via, ou melhor, pela qual já
não me preocupava em olhar. E, num rompante, assim
que o avião decolou, lembrei-me da
primeira vez que voara.



Senti novamente e estranhamente aquela ansiedade, aquele frio
na barriga. Olhava o avião rompendo as nuvens escuras
até que, tendo passado pela chuva, apareceu o céu.



Era de um azul tão lindo como jamais tinha visto. E também o sol,
que brilhava como se tivesse acabado de nascer.



Naquele instante, em que voltei a ser criança, percebi que
estava deixando de viver um pouco a cada viagem em
que desprezava aquela vista.



Pensei comigo mesmo: será que em relação às outras coisas da minha
vida eu também não havia deixado de m e sentar à janela, como,
por exemplo, olhar pela janela das minhas amizades, do meu
casamento, do meu trabalho e convívio pessoal?



Creio que aos poucos, e mesmo sem perceber, deixamos
de olhar pela janela da nossa vida.



A vida também é uma viagem e se não nos sentarmos à janela,
perdemos o que há de melhor: as paisagens, que são nossos
amores, alegrias, tristezas, enfim, tudo
o que nos mantém vivos.



Se viajarmos somente na poltrona do corredor, com pressa
de chegar, sabe-se lá aonde, perderemos a oportunidade
de apreciar as belezas que a viagem nos oferece.



Se você também está num ritmo acelerado, pedindo sempre
poltronas do corredor, para embarcar e desembarcar
rápido e 'ganhar tempo', pare um pouco e reflita
sobre aonde você quer chegar.



A aeronave da nossa existência voa célere e a duração
da viagem não é anunciada pelo comandante. Não
sabemos quanto tempo ainda nos resta.



Por essa razão, vale a pena sentar próximo da janela
para não perder nenhum detalhe. Afinal, 'a vida,
a felicidade e a paz são caminhos e não destinos'.

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